amor amor amor




















Nesta fase a Alice só quer adormecer com a mãe. Às vezes não apetece. Às vezes demora muito. Às vezes tento impingir o pai. "Hoje vais dormir com o pai?". Mas a resposta não surpreende. E lá subimos as escadas. Em direção à rotina. Até que a luz se apaga. E enroscamo-nos uma na outra. No verão custa mais. Às vezes ficamos coladas. Nas noites mais quentes. E nas mais longas. Nem sempre é fácil. Nem sempre a canção resulta. Mas se não canto a Alice canta por mim. Como se me pedisse. E quando recomeço ela silencia. Mas há noites em que não fica. Demora. Ontem foi assim. Estava difícil. Não queria descolar-se de mim. E vamos dançando pelo quarto. Mas o cansaço chama-me. Nessa altura é a cadeira antiga de madeira que nos embala.  Até eu fecho os olhos. Descanso. Mas não resulta. Ganho forças. Às vezes perco a paciência. Mas disfarço e volto a dançar. E quando não resulta regresso ao descanso. Ontem foi assim. Nessas noites levo-a para a minha cama. Ficamos. Camufladas. Uma na outra. Os meus braços nas pernas dela. As pernas dela nos meus braços. Ficamos. Entrelaçadas. Abraçadas. Sufocamo-nos. De amor. E ela adormece. De imediato. E agora sou eu que não consigo descolar-me dela. Fico ali. A olhar para ela. Venero-a no escuro. Encho o meu coração com os pensamentos. Acumulo amor como se de um balão se tratasse. Enche e enche e enche. Penso que a amo. Que a amo. Que a amo. Recordo-a no dia a dia. Vivo os momentos de novo. Mas de uma forma mais intensa. Em crescendo. Vivo a Alice nas suas primeiras conversas. Nas suas brincadeiras. Nas atitudes. No dia a dia. Mas vivo de outra forma. Em êxtase. E no escuro penso e sorrio. E estou menos colada à ela porque me vou libertando. Mas não paro de lhe tocar. Suavemente. E de pensar. Que amor. Que amor. Que amor. E depois pego nela. Para a devolver. Ao berço. Ao quarto. E para me devolver a mim. E quando pego nela. Pesada como nunca. Entregue a mim como nunca. A cabeça estende-se no meu braço e os meus lábios percorrem o rosto dela. Beijo-a. Beijo-a. Beijo-a. E penso no amor. No amor. No amor. Parece impossível. Parece inacreditável. Parece mais que tanto. Parece que este balão enche sem parar. E sem rebentar. Depois transfiro o peso pesado para o berço. E peço que descanse. Que Deus a abençoe. E agradeço. E depois regresso. A mim. Às tarefas. Ao dia seguinte. A Alice vai voltar a querer a mãe. A dormir com a mãe. E eu nem sempre vou ter vontade. Às vezes custa. Às vezes demora. Mas será para sempre o momento em que os meus olhos ultrapassam o escuro e fazem transbordar o coração. Um dia sei que vou deixar de impingir o pai. Espero não precisar de impingir a mãe. Espero que ela se enrosque na minha cama e me faça pensar no amor. No amor. No amor. 


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